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Enfermeira que atendeu vítimas do césio deve ser indenizada, em Goiás

Mulher afirma que teve câncer após socorrer pacientes na tragédia de 1987. Estado terá de pagar R$ 57,5 mil por danos morais e materiais; cabe recurso.

Fonte: G1
Paula Resende Do G1 GO
 

O Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) manteve a decisão de que o governo estadual deve indenizar a enfermeira aposentada Celmiriam Corrêa, 52 anos, antiga servidora da Secretaria de Estado da Saúde, que teve câncer após atender pacientes contaminados pelo césio-137, em Goiânia. Ela deve receber quase R$ 57,5 mil por danos morais e materiais. A decisão ainda cabe recurso.

O acidente radiológico aconteceu em setembro 1987, após catadores de papel abrirem um aparelho de radiologia, que continha o material radioativo. A enfermeira revela que não usou equipamentos de proteção durante o atendimento aos pacientes contaminados. "A gente não teve opção. Era uma emergência e tinha que ser feito o atendimento. A gente não usou nada de proteção, quem usava eram os técnicos que tinham contato direto”, disse em entrevista ao G1.

Celmiriam descobriu o câncer de mama dez anos após a tragédia. Ela retirou 40% da mama, passou por quimioterapia e radioterapia. Após esses tratamentos, ela continuou com o uso de medicação, mas a doença retornou cinco anos depois. Foi quando ela teve que se aposentar.

De acordo com a enfermeira, ela entrou com pedido de pensão na Secretaria de Saúde. No entanto, o recurso foi negado. Por isso, ela decidiu entrar com ação indenizatória na Justiça.

Durante o processo, a Junta Médica do TJ-GO concluiu que é impossível "estabelecer o nexo causal” entre o atendimento a pacientes e o surgimento do câncer. No entanto, análise da Superintendência Leide das Neves Ferreira (Suleide), órgão público instituído para monitorar e prestar assistência médica integral aos radioacidentados, concluiu que a enfermeira possui enfermidade crônica e grave devido à radiação.

Para Celmiriam, "não há dúvida” de que o atendimento com vítimas da tragédia provocou o câncer. "Eu nunca tive caso de câncer da família, não tinha idade que justificava, tive três filhos e os amamentei, ou seja, eu não pertencia a nenhum grupo de risco se não fosse o contato com os pacientes”, defende.

Processo

Em primeiro grau, decisão da 2ª Vara da Fazenda Pública Estadual de Goiânia ordenou o pagamento de R$ 50 mil por danos morais. A sentença ainda determinou indenização por danos materiais de R$ 7.445,37, referente ao que a enfermeira gastou no tratamento do câncer. O governo recorreu da decisão.

Ao analisar a apelação, o desembargador Kisleu Dias Maciel Filho não acatou o pedido do estado. O magistrado considerou o laudo da Suleide e o depoimento de testemunhas. O relatou reformou parcialmente a decisão de primeiro grau ao aumentar o valor dos honorários de R$ 1 mil para R$ 4 mil. O estado ainda pode recorrer da sentença.

Acidente radiológico

A tragédia com o césio-137 começou quando os dois catadores de recicláveis abriram o aparelho de radioterapia em um prédio público abandonado, no dia 13 de setembro de 1987, no Centro de Goiânia. Eles pensavam em retirar o chumbo e o metal para vender e ignoraram que dentro do equipamento havia uma cápsula contendo o metal radioativo.

Apesar de o aparelho pesar cerca de 100 kg, a dupla o levou para casa de um deles, no Centro. Já no primeiro dia de contato com o material, ambos começaram a apresentar sintomas de contaminação radioativa, como tonteiras, náuseas e vômitos. Inicialmente, não associaram o mal-estar ao césio-137, e sim à alimentação.

Depois de cinco dias, o equipamento foi vendido para Devair Alves Ferreira, dono de um ferro-velho localizado no Setor Aeroporto, também na região central da cidade. Neste local, a cápsula foi aberta e, à noite, Devair constatou que o material tinha um brilho azul intenso e levou o material para dentro de casa.

Devair, sua esposa Maria Gabriela Ferreira e outros membros de sua família também começaram a apresentar sintomas de contaminação radioativa, sem fazer ideia do que tinham em casa. Ele continuava fascinado pelo brilho do material. Entre os dias 19 e 26 de setembro, a cápsula com o césio foi mostrada para várias pessoas que passaram pelo ferro-velho e também pela casa da família.

A primeira vítima fatal do acidente radiológico foi a garota Leide das Neves Ferreira, de 6 anos. Ela se tornou o símbolo dessa tragédia e morreu depois de se encantar com o pó radioativo que brilhava durante a noite. A menina ainda fez um lanche depois de brincar com a novidade, acabou ingerindo, acidentalmente, partículas do pó misturadas ao alimento.

O acidente fez centenas de vítimas, no entanto, o Governo de Goiás e as autoridades envolvidas só assimiram quatro mortes, ocorridas pouco depois do acidente, incluindo o caso da menina.

No âmbito radioativo, o acidente com césio-137 só não foi maior que o registrado na usina nuclear de Chernobyl, em 1986, na Ucrânia, segundo a Cnen. Cerca de 6 mil toneladas de lixo radioativo foram recolhidas na capital goiana e levada para Abadia de Goiás, onde permanece até os dias atuais.

Passadas mais de duas décadas, os resíduos já perderam metade da radiação. No entanto, o risco completo de radiação só deve desaparecer em pelo menos 275 anos.

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