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Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares

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Nuclear contra a COVID-19

Inativação do vírus por radiação ionizante abre novas possibilidades de combate à doença

Fonte: Conexão Nuclear/ABDAN

A vacinação contra o coronavírus avança no mundo, trazendo novas esperanças em diversos países onde já se vê o 
impacto da ação preventiva, mas a doença ainda tem muitos mistérios e efeitos pouco claros no organismo humano. 
Diversos estudos apontam variadas interpretações, mas um fator fundamental para a evolução dessas pesquisas, que podem trazer descobertas importantes também para a criação de tratamentos de infectados, é a possibilidade de inativação do vírus para análise em laboratórios menos complexos, o que facilita muito o trabalho e amplia enormemente a gama de locais apropriados para essa atividade. É nessa frente que a tecnologia nuclear vem ganhando relevância e já se revela uma ferramenta importante no cenário de combate à pandemia, a exemplo da parceria realizada entre o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) e o Instituto Butantan, que teve como um dos resultados o desenvolvimento do soro anti-Covid, em fase de testes clínicos aprovados pela Anvisa recentemente.

A atuação do IPEN na inativação de vírus a partir da radiação ionizante não vem de hoje, mas ganhou mais força com os desafios trazidos pela pandemia do Covid-19. Em anos anteriores, o instituto já havia trabalhado com a técnica inclusive para a inativação do vírus da dengue, e os primeiros contatos com o Butantan se deram ainda com foco no Zika Vírus. Quando começou o SARS-CoV-2, os dois institutos reativaram a parceria para ver se era possível fazer a inativação por radiação ionizante.

A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) já tinha começado a fazer um estudo dessa inativação em outros lugares ao redor do mundo e os resultados eram promissores. Diferente de outros vírus, o SARS-CoV-2 se mostrava mais sensível à radiação, ou seja, podia ser inativado com doses mais baixas. Com isso, a relação entre o IPEN e o Butantan foi reforçada.

"As técnicas químicas de inativação são mais conhecidas, mas geram alguns problemas depois para purificação”,  explica a doutora Monica Mathor, pesquisadora do IPEN envolvida no processo.

O processo de inativação é complexo e começa ainda com a definição da rádio resistência do vírus. Para isso, existe uma determinação chamada D10, que avalia a quantidade de radiação dada a um organismo para reduzir em 90% a concentração viral. Com esse valor, torna-se possível estipular qual a dose ideal. Como o vírus é muito infeccioso, qualquer estudo com ele ativo precisa ser feito em locais específicos, os laboratórios chamados NB3 (com nível de biossegurança 3, raros no Brasil), o que limita bastante as possibilidades de pesquisa. Com o vírus inativado, no entanto, é possível realizar estudos em laboratórios simples, de modo que muitas novas frentes de trabalho foram abertas.

"Você pode inativar o vírus para manipular diretamente, como no caso do soro, ou até num tecido para transplante, e tudo isso pode ser feito com o SARS-CoV-2, que tem uma rádio resistência menor do que outros vírus. Com isso, não precisa dar doses muito altas, o que não deteriora o material em que está o vírus, e com essa dose consegue inativá-lo mantendo a estrutura terciária praticamente intacta”, explica Mathor.

Essa estrutura é uma forma com espículas, arredondada, em 3D, e fica preservada, o que gera a possibilidade de induzir a formação de anticorpos num organismo.

"É a lógica por trás da produção de vacinas. E serve também para a produção da soroterapia, além de abrir possibilidades para outros tipos de tratamento”, ressalta a pesquisadora.

A parceria com o Butantan, inclusive, começou direcionada ao desenvolvimento de uma vacina brasileira, mas com o acordo fechado entre o instituto e a China, envolvendo a Coronavac, o trabalho foi redirecionado para a produção do soro anti-Covid.

Soro e outros tratamentos

A produção do soro é feita a partir da inoculação do vírus inativado em cavalos, que têm uma capacidade de produção de anticorpos 50 vezes maior que os seres humanos. Após isso, ocorre a retirada do plasma sanguíneo do animal, repleto dessas proteínas, para então passar por um processo de purificação e controle de qualidade, de modo que restem apenas os anticorpos. O resultado disso é o soro, voltado ao tratamento de pessoas já infectadas, diferente do foco preventivo que é promovido pelas vacinas.

"Sempre vai existir um grupo de pessoas que não responde às vacinas, por conta de problemas imunológicos, como pessoas com sistema imune deprimido, pessoas transplantadas, que precisam ser mantidas em imunossupressão porque têm uma doença autoimune, ou algo do tipo”, ressalta a diretora de inovação do Instituto Butantan, Ana Marisa Chudzinski-Tavassi, ao enfatizar a importância do soro, que teve a fase de estudos clínicos aprovada pela Anvisa no final de maio.

A nova etapa ocorre no Hospital do Rim de São Paulo e no Hospital das Clínicas da USP, com um total de pacientes estimado em 618 participantes, em três momentos. Nas fases 1 e 2, é avaliada a segurança do tratamento, com 30 
pessoas em cada grupo, o que leva à definição da quantidade de doses necessárias e da segurança das doses. Na etapa 3, as doses ideais são aplicadas num número maior de pessoas, com 558 pacientes, para a medição da eficácia.

"A primeira fase é voltada a pacientes que têm sistema imune já deprimido, com alta probabilidade de desenvolver 
uma doença grave. Nas etapas posteriores, isso é expandido, mas o foco continua em pessoas com alto risco de desenvolver a doença grave, mas que não estejam em estado grave. A intenção é justamente reduzir os casos graves”,
reitera Chudzinski-Tavassi.

Nas fases prévias dos estudos, os resultados foram bastante promissores. A pesquisa partiu da infecção de hamsters com o vírus, para posteriormente serem tratados com o soro. Dois dias depois da inoculação, quando já apresentavam sintomas da doença, foi injetado o soro, que levou à diminuição da carga viral nos pulmões dos animais, assim como à modulação da resposta inflamatória e à preservação das estruturas pulmonares quando comparados aos que não receberam o tratamento.

Agora, com a fase de ensaios clínicos, o soro está mais perto de chegar à rede de tratamento brasileira. Após os testes, se forem confirmados os resultados positivos, ocorre o registro na Anvisa. Caso tudo avance como esperado, poderá virar um medicamento para uso mais amplo.

Além disso, a parceria com o IPEN abriu novos caminhos de pesquisa.

"Irradiar o material que vem dos cultivos é muito bom, abre muitas frentes e pode gerar muita coisa interessante. Estamos caminhando com o soro e também com uma pesquisa que pode gerar um novo produto. E esse novo, se surgir, só terá sido possível porque irradiou, porque permitiu tirar o material inativado para trabalhar em laboratórios com níveis de segurança mais baixos”, afirma Chudzinski-Tavassi.

Um dos estudos em curso a partir dessa parceria é voltado a entender o que o vírus faz em diferentes células, como no pulmão, em vasos sanguíneos e neurônios, por exemplo.

"Se eu conheço aquilo que acontece como efeito, eu posso bloquear por várias formas. Posso desenhar um novo 
medicamento, posso fazer um reposicionamento de medicamentos existentes. Estamos falando de algo que possa ser desenvolvido como antiviral ou algo que bloqueia a ação do vírus, e não apenas soro e vacina”, conclui a diretora de inovação do Butantan.

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